13.1.13

Hugo (2011)

A Invenção de Hugo, Martin Scorsese


Antes de mais, congratular Scorsese na precisa e nostálgica homenagem que fabricou aos primórdios do cinema (ao que parece tão esquecido e enterrado) sobretudo, porque carrega em si, mesmo que involuntariamente, toda uma aprendizagem, uma história e acima de tudo uma cultura inestimáveis, rebuscadas desde o período mudo até à recente inovação a três dimensões de que, aliás, se serve adequadamente.

Depois, expressar a minha desilusão pelo produto final, pelo que aquilo que se antevinha como emocional, arrebatador e essencial, se traduziu num simples e descomplexo exercício narrativo (porque de filmagem Scorsesiana, caracterizada, nem vê-la) típico, sensacionalista, fantástico em demasia e escasso no que, essencialmente, diz. Em suma, uma história ingénua, de deslumbramento fácil e por isso pouco verdadeira e pouco profunda no que quer, tão altruisticamente, transmitir - ainda que inevitavelmente o consiga em parte, daí a significante estima que se lhe tem.

Hugo, o personagem e o filme, transportam inicialmente todo um imaginário fabricado pelas expectativas, pelas sugestões e indicações que nos vão sendo projectadas, e por todo um peso cultural que a sua história e mensagem acarretam. Tudo, repito, segundo um padrão ainda assim recorrente e mecanizado. A própria construção dos personagens é em si curta, pouco densa, usando (e abusando) de alguns membros como meros guias na viagem e interpretação temporais (a Isabelle de Chloë Moretz, por exemplo). Ao invés de explorar os instrumentos que detém para alcançar um melhor desempenho e destreza culturais e emocionais, recorre à técnica e tácticas usuais numa estrutura formal claramente repetitiva e dependente de mecanismos-base da indústria de que faz parte. Apesar de utilizar esses recursos, há que o dizer, equilibrada e proporcionalmente, nunca se desfazendo ou se reduzindo, nesse sentido, em demasia.

Por outro lado, no encalço da câmara (e do 3D) acompanhamos o início com alguma dinâmica, no excelente plano-sequência e na exploração que as potencialidades argumentativas evidenciam ou a inovação tecnológica assim o permita. No entanto, essa vontade às tantas também se reduz à tal cadência comum do seio no qual o filme se insere e se vende. Uma pena, novamente, perante o enorme alcance que poderia ter tido e a enorme capacidade que detinha, seja no tema em si, seja nas linguagens da sugestão e manipulação de um cinema mudo, que poderia e deveria ter sido muito mais explorado. No fim, contudo, o resultado não se afigura assim tão mau, está inclusive acima da média, sendo que se trata de um filme interessante, capaz, apesar de tudo, de reflectir e transmitir qualquer coisa, no caso - uma sugestão para toda a família e uma homenagem a George Méliès, um dos primeiros e maiores impulsionadores da sétima arte enquanto fábula, enquanto ficção.


Jorge Teixeira
classificação: 6/10

7 comentários:

  1. Olá! Adorei seu blog, muito criativo! Gostei de "Hugo", acredito que a narrativa me decepcionaria se a única missão do personagem fosse remontar o robô. Também fiquei feliz por o filme despertar no público a curiosidade pelo cinema mudo.
    Também tenho um blog e gostaria que vc desse uma olhada. O endereço é: http://www.criticaretro.blogspot.com/ Passe por lá! Lê ^_^

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  2. Lê, Obrigado pelos elogios. Sim também fico contente por despertar, sobretudo para outras gerações e meios sociais, o cinema mudo e as origens da sétima arte. Contudo, e tal como referi, poderia ter resultado em algo bem melhor.

    Cumprimentos,
    Jorge Teixeira
    Caminho Largo

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  3. Jorge, acho que compreendo o teu descontentamento mas não entendi o filme da mesma forma. Fiquei grande fã, apesar do lado talvez um pouco inocente que Hugo possa ter, mas a homenagem ao primórdios do cinema consegue encantar e emocionar-me.
    Concordo com a questão que apontas relativamente ao 3D, do qual estou longe de ser apologista. Vi o filme duas vezes, uma vez em 3D e outra em 2D e desfrutei muito mais na segunda visualização.

    Cumprimentos cinéfilos.

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  4. Penso que a força do filme está na forma como as histórias se desdobram, qual boneca russa, saindo umas de dentro das outras. Começamos pela história de um rapaz, passamos para a de um boneco misterioso, saltamos para a de um velho, e terminamos na própria história do cinema. A forma como nem notamos como saltamos sucessivamente de um nível para outro é tão mágico como o cinema em si, e a sua capacidade de nos fazer saltar de um mundo para outro. Achei o filme belíssimo.

    Cumprimentos.

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  5. INÊS MOREIRA SANTOS, Pois, percebo o fascínio, e até a adoração que se poderá ter pelo filme, mas não deixo ainda assim de lhe apontar imensos defeitos, sobretudo quando referencia um cinema tão esquecido e tão afastado de nós hoje em dia e o transmite simultaneamente segundo um padrão por demais comum e dependente da actual mecânica americana.

    AJANELAENCANTADA, Sim a história é capaz de ser bela, construtiva e agradável de se assistir, às tantas porque nos interessa, acima de tudo, o tema. Mas um filme não se faz só disso, ficando depois todo um argumento e uma realização aquém do esperado, isto tendo em conta o cineasta e homenagem envolvidos.

    Cumprimentos,
    Jorge Teixeira
    Caminho Largo

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  6. Quanto a este genial HUGO estamos em grande desacordo, sobretudo quanto ao teu 2º parágrafo. Tornou-se imediatamente, inclusivé, um dos meus Scorseses favoritos. Será uma das próximas críticas no CINEROAD, onde terei oportunidade de aprofundar os meus argumentos assim que voltar a assistir ao filme.

    Roberto Simões
    CINEROAD
    cineroad.blogspot.com

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  7. ROBERTO SIMÕES, Pois, de facto, este é dos tais que não me encaixou totalmente, apesar de até ter gostado o quanto baste, sobretudo quando se debruça sobre os primórdios e as referências da sétima arte. Mas, e tal como disse, esta homenagem poderia e deveria ter sido veiculada de forma bem mais única, bem mais diferenciada e bem mais próxima ao cinema que tanto homenageia e tanto poderia ter sustentado o próprio filme que, convenhamos, está mais dependente da banalidade das linguagens actuais, na velocidade e montagem (ainda que compreensivelmente), que propriamente na sugestão, manipulação e filmagem do mudo. A homenagem restringe-se assim à mensagem e a algumas linhas do argumento. Pelo menos é essa a visão que detenho de momento deste filme. Fico a aguardar a tua crítica ao mesmo :)

    Cumprimentos,
    Jorge Teixeira
    Caminho Largo

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